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terça-feira, 11 de outubro de 2011

O moço do café quente, coração frio


Olha, nós não nos conhecemos, mas eu o vejo passar pelo mesmo lado da calçada todos os dias no mesmo horário. Do mesmo jeito. Daqui da janela do meu apartamento, vejo você com essa jaqueta de couro marrom escuro, esse jeans surrado, as botas sujas de areia, o jornal em baixo do braço e a caneca térmica de café. Tá, eu sei que não nos conhecemos, mas eu vejo nos seus olhos que as coisas não correm muito bem na sua vida. Não que eu queira me intrometer. Eu só queria esquentar seu coração que parece tão frio. Vejo você caminhando nessa solidão bizarra e pergunto-me se não há sequer uma companhia pra você. Sabe, nem um guarda-chuva?

Lá vai você com seu café quente e esse jornal amassado, com a calça surrada e a bota melada. Seguindo sempre na mesma direção. Olha, cuidado ao atravessar a rua. O trânsito de São Paulo não está pra brincadeira. Você sequer olha para os lados direito. Você tem é sorte, moço, de nenhum louco ter-lhe atropelado e picotado seu jornal amassado e esse café quente.

A partir daí eu não vejo mais. Só no dia seguinte. Eu não sei por onde tu voltas, mas toma cuidado com a noitada da cidade. Os adolescentes estão pirando por aí e descontando em todo mundo, viu?
Moço, eu vou deixar esse papel no chão, colado no poste cinza que você toda vez se esbarra. Só pra não encostar-se em ninguém na rua. Espero que note algo diferente no seu caminho. Espero moço, que o senhor ponha mais cor nessa tua vida. Sorria mais. Responda os bons dias desejados a ti, sabe? Daqui de cima te vejo carente e ninguém segue sozinho, tá? Mas mesmo sem te conhecer, saiba que você não está sozinho. Daqui de cima eu olho por você. Todos os dias. E fico torcendo para que você chegue do outro lado da rua sã e salvo na esperança do dia seguinte vê-lo sorrir.

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